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Análise da distribuição espaço-temporal de dengue e da infestação larvária no município de Tupã, Estado de São Paulo

Gerson Laurindo BarbosaI; Roberto Wagner LourençoII

IDepartamento de Controle de Vetores, Superintendência de Controle de Endemias, Secretaria de Estado da Saúde, São Paulo, SP IIUniversidade Estadual Paulista, Campus de Sorocaba, Sorocaba, SP

DOI: 10.1590/S0037-86822010000200008


RESUMO

INTRODUÇÃO: O vírus da dengue é transmitido pela picada do mosquito Aedes aegypti e, o atual programa de controle não atinge o objetivo de impedir sua transmissão. Este trabalho objetivou analisar a relação entre a distribuição espaço-temporal de casos de dengue e os indicadores larvários no município de Tupã, de janeiro de 2004 a dezembro de 2007.
MÉTODOS: Foram construídos indicadores larvários por quarteirão e totalidade do município. Utilizou-se o método cross-lagged correlation para avaliar a correlação entre casos de dengue e indicadores larvários. Foi utilizado estimador kernel para análise espacial.
RESULTADOS: A correlação cruzada defasada entre casos de dengue e indicadores larvários foi significativa. Os mapas do estimador Kernel da positividade de recipientes indicam uma distribuição heterogênea, ao longo do período estudado. Nos dois anos de transmissão, a epidemia ocorreu em diferentes regiões.
CONCLUSÕES: Não ficou evidenciada relação espacial entre infestação larvária e ocorrência de dengue. A incorporação de técnicas de geoprocessamento e análise espacial no programa, desde que utilizados imediatamente após a realização das atividades, podem contribuir com as ações de controle, indicando os aglomerados espaciais de maior incidência.

Palavras-chaves: Aedes aegypti. Dengue. Geoprocessamento. Análise espacial.


ABSTRACT

INTRODUCTION: The dengue virus is transmitted by the bite of the mosquito Aedes aegypti and the current control program has not met the target of preventing its transmission. This study aimed to analyze the relationship between the spatial-temporal distribution of dengue cases and the larval indices in the municipality of Tupã between January 2004 and December 2007.
METHODS: Larval indices were built up block by block and for the entire municipality. We used the cross-lagged correlation method to assess the correlation between dengue cases and larval indices. The kernel estimator was used for spatial analysis.
RESULTS: The cross-lagged correlation between dengue cases and larval indices was significant. The kernel estimator maps of positive findings among recipients indicated heterogeneous distribution over the course of the study period. Over two years of transmission, the epidemic occurred in different regions.
CONCLUSIONS: There was no evidence of a relationship between larval infestation and dengue occurrence. Incorporation of geoprocessing techniques and spatial analysis into the program, if used immediately after completion of activities, might contribute towards the control actions, thereby indicating spatial agglomerations of higher incidence.

Key-words: Aedes aegypti. Dengue. Geoprocessing. Spatial analysis.


 

 

INTRODUÇÃO

O dengue é uma doença infecciosa aguda, causada por um vírus da família flavivírus, de grande magnitude epidemiológica e amplitude demográfica, ocasionando grandes epidemias no mundo principalmente nas regiões tropicais, atingindo milhões de pessoas anualmente1-6. O complexo dengue é formado por quatro sorotipos: Den-1, Den-2, Den-3 e Den-44.

Aedes aegypti é o único vetor reconhecidamente transmissor desses vírus, de importância epidemiológica nas Américas4,7. A luta contra o mosquito Aedes aegypti, vetor bem adaptado ao ambiente urbano, tem sido intensa desde os tempos de Oswaldo Cruz. Porém, mesmo após várias tentativas de erradicação, o vetor continua presente em todo o território nacional, causando seguidas epidemias de dengue.

Donalísio e Glasser8 apontam ser fundamental a realização periódica de atividades de vigilância entomológica, para o dimensionamento do impacto das medidas de controle, e orientar ajustes nas ações prescritas pelos programas de controle de vetores e epidemias. Ainda apontam que algumas questões básicas não são respondidas pelos programas de controle de vetores, como por exemplo: “que áreas ou bairros da cidade possuem maiores níveis de infestação?

Neste sentido, o estudo da distribuição espaço-temporal da ocorrência de larvas pode produzir um diagnóstico para acompanhar a infestação das diversas áreas de um município, indicando a presença do vetor e orientando ações de eliminação direcionadas9. No Brasil, há poucos estudos sobre a distribuição espacial da população de Aedes aegypti, pois a maioria deles dá maior ênfase à distribuição dos agravos de saúde10,11. As técnicas de análise de dados espaciais visam identificar padrões de distribuição segundo alguma dependência espacial12. Dentro dessa perspectiva, o uso de técnicas de análise espacial pode se tornar instrumento importante no planejamento de ações voltadas à redução de densidade do vetor Aedes aegypti.

Neste sentido, esta pesquisa buscou conciliar o conhecimento de ferramentas de análise espacial na rotina de avaliação do Programa de Controle de Dengue no Estado de São Paulo, com ênfase na avaliação da distribuição espaço-temporal dos casos de dengue e da positividade larvária em recipientes encontrados na atividade de “Casa a Casa” no município de Tupã, São Paulo, Brasil, buscando estabelecer a relação entre a ocorrência de dengue e positividade de recipientes.

 

MÉTODOS

Foi realizado um estudo ecológico exploratório sobre a distribuição espacial dos casos de dengue e da positividade de recipientes para larvas, no município de Tupã, SP, onde se utilizou informações da atividade “Casa a Casa”, realizada pelo município no Programa de Controle da Dengue, e de casos de dengue confirmados, nos anos de 2004 a 2007.

Na rotina da atividade de Avaliação de Densidade Larvária no Município de Tupã, mais de 80% dos recipientes encontrados com larvas de culicídeos são positivos para Aedes aegypti. Com base nesta informação, e o fato da atividade “Casa a Casa” ser realizada com o registro da informação de recipientes com presença de larvas, decidiu-se trabalhar com os dados da atividade “Casa a Casa”, considerando também que esta atividade realiza cobertura total do município periodicamente e não é realizada por amostragem como a atividade de Avaliação de Densidade Larvária.

A atividade “Casa a Casa” é realizada no município de forma integrada por agentes de controle de vetores (ACV), com cobertura trimestral e, agentes comunitários de saúde (ACS), com cobertura mensal. Considerando a integração e equidade das duas equipes, as informações foram agrupadas para análise. Optou-se por analisar a informação do indicador de infestação do município mensalmente e a comparação da positividade de quarteirões trimestralmente. Para tanto, os dados deste estudo foram agrupados por mês, sendo o indicador da positividade de recipientes com larvas no município por mês, dado por:

Por trimestre foi considerado o indicador da positividade de recipientes com larvas por quarteirão trabalhado da seguinte forma:

A área de estudo possui 25.284 imóveis, e 1.251 quarteirões numerados em ordem crescente. Desta forma foi possível relacionar os dados dos quarteirões com o Sistema de Informação Geográfica utilizado nesta pesquisa.

As informações sobre os casos de dengue foram fornecidas pela coordenadoria de controle de vetores do município, agrupados por mês e ano de ocorrência.

Houve registro de casos de dengue em 2006 e em 2007, e a proporção de incidência de dengue foi calculada pela razão entre o número absoluto de casos por mês e ano e a população residente, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), da seguinte forma:

Para os casos da dengue, também, foi construído um Sistema de Informação Geográfica tendo como unidade de análise os quarteirões que apresentaram casos.

Para avaliar a relação entre a positividade de recipientes com larvas e os casos de dengue, foi utilizado o método cross-lagged correlation, ou correlação cruzada defasada. O uso de indicador larvário, neste estudo, evidencia um intervalo de tempo para a ocorrência de associações mais explícitas. Considerando o período de desenvolvimento embrionário, tempo de eclosão de larvas, tempo de desenvolvimento das formas imaturas e período de incubação (extrínseco e intrínseco) constituem-se componentes que contribuem para explicar a necessidade de considerar o intervalo de tempo (time lag) na busca de associações entre tais eventos. A correlação cruzada defasada é definida como:

x(i) e y(i) são os valores correspondentes ao i-ésimo elemento de cada série.

r corresponde ao tempo de defasagem.

mx e my são as médias das séries correspondentes.

A partir de uma base cartográfica em formato digital, georreferenciada no sistema plano cartesiano, contendo os desenhos dos quarteirões do município foram inseridos os números dos quarteirões, retirado de um mapa impresso utilizado pelas equipes no campo. Com esta base, foi construído o Sistema de Informação Geográfica, e os polígonos dos quarteirões foram codificados por seu respectivo número, relacionados com a base de dados da atividade “Casa a Casa” e, os registros de casos de dengue por quarteirão.

Para analisar a distribuição espacial da intensidade da positividade de recipientes por quarteirão, foi utilizado o estimador de intensidade Kernel, uma técnica de alisamento que fornece por meio de interpolação, a intensidade do processo em toda região de estudo13. O ponto considerado foi o centróide de cada quarteirão. Seja S que representa uma localização geral em R e S1,S2 ,…, Sn as localizações de n eventos observados, então a intensidade λ(s) é definida por:

 é o valor estimado por área;

 é um valor entre 0 e 1 que representa uma correção de borda;

 é a largura da banda e determina o fator de suavização;

 é o centro de cada espaço da grade regular;

 é o local de ocorrência do evento;

 é uma função de densidade de probabilidade.

 é o valor do evento no ponto, ou seja, o indicador da positividade de recipientes.

O parâmetro largura da banda ou raio de influência (Ä) define a vizinhança do ponto a ser interpolado e controla o alisamento da superfície gerada (raio de um disco centrado em S). Este estudo considerou como raio de influencia a distância de vôo do Aedes aegypti, definindo a largura da banda em 280m, utilizando como base Freitas e Lourenço-de-Oliveira14 que avaliaram a dispersão de fêmeas de Aedes aegypti, sem manipulação de recipientes e sem barreira geográfica ao vôo do mosquito, e concluíram que a dispersão média de vôo foi de 288m.

Foram também utilizados dados de temperatura e pluviosidade média, no município de Tupã, para comparação com os dados de infestação e casos de dengue, no período de estudo.

 

RESULTADOS

Observa-se na Tabela 1 que, no ano de 2004, há uma grande redução no número de quarteirões e imóveis trabalhados nos meses de abril e maio. Houve uma perda de dados devido à mudança de computador, que não foi recuperado pelo município. O número total de quarteirões trabalhados no trimestre corresponde à contagem dos mesmos trabalhados no período, ou seja, cada quarteirão foi contado uma única vez no trimestre, independente do número de vezes que tenham sido trabalhados. Assim, pode-se identificar a cobertura do município no período. De acordo com o total de quarteirões trabalhados, nota-se que em nenhum dos trimestres de todo o período de estudo foi realizada a cobertura total do município. Porém, com exceção dos períodos onde houve epidemia de dengue (primeiro e segundo trimestre de 2006 e 2007) e o segundo trimestre de 2004, por conta da perda da informação, o total de quarteirões trabalhados aproxima-se da totalidade.

Nos anos de 2004 e 2005, o município não registrou nenhum caso de dengue autóctone. Já nos anos de 2006 e 2007, foram registrados, segundo informações da Secretaria Municipal de Saúde do Município de Tupã, 272 e 672 casos, respectivamente.

A proporção de incidência dos casos nos anos de 2006 e 2007 é apresentada na Tabela 2, agrupados segundo divisão de área de trabalho do controle de vetores do município. O total de casos compreende os casos classificados, segundo critérios laboratoriais disponibilizados pelo município, agrupados por quarteirão e mês de incidência. Vê-se uma maior ocorrência de casos no ano de 2006, na área 1 do município, com uma incidência de 281,1 casos, por 100 mil habitantes. A distribuição das proporções de incidências nos meses se comporta de maneira semelhante nas duas áreas. Observa-se a incidência crescente de janeiro a abril, onde atinge o pico, e o decréscimo em seguida, até o fim da epidemia em junho. Já no ano de 2007, a incidência atinge o seu pico em março; porém, a epidemia atinge maiores proporções, com mais do que o dobro de casos de 2006 e se estendendo até agosto. Em 2007, diferentemente de 2006, um número maior de casos é registrado na área 2.

Analisando a positividade de recipientes com larvas apresentadas na Figura 1A, e a temperatura e chuva média na Figura 1B, vê-se uma sazonalidade semelhante, onde se observa que os maiores valores dos índices (Figura 1A) estão nos meses mais quentes e úmidos do ano (Figura 1B).

 


 

O pico do índice de recipientes no ano de 2006, foi atingido no mês de fevereiro, enquanto o pico da transmissão de dengue foi atingido no mês de abril. No ano de 2007, o pico do índice de recipientes ocorreu no mês de janeiro e o pico da transmissão ocorreu em março. Tanto em 2006, como em 2007, o pico da epidemia ocorreu dois meses após o pico do índice de recipientes. Nota-se, também, uma semelhança nas curvas do índice de recipientes e de transmissão de dengue; porém, há um deslocamento da curva de dois meses.

A correlação cruzada defasada apresentou alta correlação positiva, nos anos de 2006 e 2007, estatisticamente significativa (p<0,05), considerando 2 meses de defasagem nos índices larvários, com valores observados de 0,83 e 0,92, respectivamente para 2006 e 2007. Na medida em que essa defasagem aumenta, diminui o valor da correlação, assim como a diminuição da defasagem, não sendo observada a significância estatística.

O mapa da distribuição espacial dos casos de dengue no município de Tupã nos anos de 2006 e 2007, apresentados na Figura 2, mostra que no ano de 2006 os casos ocorrem em praticamente todo o município; entretanto, com uma concentração maior na região centro-oeste e norte do município. Como em 2006, no ano de 2007, a ocorrência de dengue acontece em todas as regiões do município, porém diferentemente do ano anterior a maior concentração ocorre na região leste e sul.

Figura 3 apresenta a modelagem espacial Kernel para visualização da distribuição espaço-temporal de larvas medidas pelo indicador da positividade de recipientes com larvas por quarteirão, por trimestre no período de 2004 a 2007. Vê-se que as variações apresentadas nos mapas são bastante distintas na área de estudo. Ao longo de todos os anos, de 2004 a 2007, observa-se diferentes concentrações de larvas nos diferentes períodos do ano.

Para os quatro anos, de 2004 a 2007, observa-se que a distribuição por trimestre não segue o mesmo padrão de distribuição, ou seja, nos diferentes anos os aglomerados de larvas se encontram em diferentes regiões. Fica evidente também um número maior de aglomerados no primeiro trimestre de cada ano, e uma menor concentração no segundo trimestre.

 

DISCUSSÃO

No município de Tupã, a atividade “Casa a Casa” é realizada por equipes de Agentes de Controle de Vetores e Agentes Comunitários de Saúde, que atuam de forma integrada no Programa de Controle da Dengue, buscando orientar a população e manter baixos níveis de infestação. Chiaravalloti-Neto cols15 analisou a integração entre os Agentes de Controle de Vetores e Agentes Comunitários de Saúde, em São José do Rio Preto e, concluiu que as ações realizadas pelas duas equipem obtiveram resultados semelhantes, e que a integração dos dois programas é viável e representa otimização de recursos, possibilitando ainda maior envolvimento da comunidade no controle do dengue.

A cobertura trimestral da atividade “Casa a Casa” no município de Tupã foi atingida pelos agentes, quase na totalidade do município, excetuando os períodos onde houve epidemia de dengue. Mesmo com essa cobertura, ainda, houve epidemia de dengue nos anos de 2006 e 2007. Resultado semelhante foi encontrado por Chiaravalloti-Neto cols16 na região de São José do Rio Preto, onde a cobertura trimestral desta atividade, incluindo o Arrastão, foi alcançada totalmente ou em grande parte pela maioria dos municípios. Mesmo assim, epidemias de dengue vinham ocorrendo na região de São José do Rio Preto, mostrando que essas atividades não foram suficientes para eliminar o risco de epidemias. Porém, se o trabalho não viesse sendo executado, epidemias maiores poderiam ter ocorrido.

A sazonalidade da positividade de recipientes encontrada neste estudo ficou bem caracterizada com as estações mais quentes e úmidas do ano, corroborando com outros estudos que também encontraram sazonalidade marcante nos mesmos períodos, como Chiaravalloti-Neto17, Serpa cols18 e Chadee cols19. Há evidências de manutenção da infestação nos níveis observados, sugerindo que há um esgotamento no nível de controle, ou seja, não indicam haver tendência de diminuição do nível de infestação larvária no município.

A correlação cruzada defasada entre os indicadores larvários e os casos de dengue, mostrou-se significativa quando se utilizou o time-lag de 2 meses. Neste caso, os indicadores larvários ajudam a descrever o comportamento da epidemia nos 2 anos de ocorrência. No Brasil, segundo Corrêa cols2 poucos estudos analisaram esta relação e os resultados são discordantes. Ribeiro cols20estudando a associação entre o número de casos de dengue e fatores abióticos identificaram intervalo de tempo em que a chuva e a temperatura contribuíram na geração de novos casos. Importante considerar que o indicador larvário, embora não seja o mais adequado para medir o risco de ocorrência de dengue, deve ser considerada como sentinela para a presença de mosquitos adultos no município, e o seu comportamento deve ser analisado. Assim, há necessidade de aprimorar a vigilância entomológica, para manter os níveis de infestação os mais baixos possíveis, e orientar ações de controle vetorial e o ambiente minimizando o impacto do dengue na população.

Nos dois anos de transmissão, os casos de dengue, embora tenham ocorrido em grande parte do município, as concentrações se mostraram distintas espacialmente em cada ano. Talvez uma explicação para a ocorrência de casos concentrados em regiões diferentes do município, nos dois anos de epidemia, seja a diminuição de susceptíveis na região onde um maior número de casos ocorreu no primeiro ano, deslocando desta maneira a concentração da epidemia do ano seguinte para outra área. Teixeira cols21 atribuem em uma maior possibilidade na redução da incidência de casos de dengue nas ondas epidêmicas ao decréscimo no número de indivíduos susceptíveis do que às medidas de controle. Almeida cols22, analisando 7 anos de epidemia de dengue em Belo Horizonte/MG, de 1996 a 2002, observaram que houve concentrações de áreas de maiores incidências e que a queda no número de casos em cada alça epidêmica podem ser atribuídos ao esgotamento dos susceptíveis, intervenção do controle vetorial e condições naturais desfavoráveis, como a diminuição da temperatura e umidade, reduzindo a densidade vetorial.

Os mapas de densidade kernel deste estudo apontam para uma distribuição da positividade de recipientes com larvas de modo irregular, ou seja, sem um padrão de variação definido da infestação na área de estudo. Ficou bem evidenciada uma maior infestação no primeiro trimestre de cada ano e menor no segundo. Souza-Santos e Carvalho11 encontraram em trabalho realizado na Ilha do governador que em determinados ciclos, alguns quarteirões positivos não eram contíguos àqueles previamente positivos, corroborando com os resultados do presente estudo.

O uso de técnicas de análise espacial neste estudo possibilitou a visualização de áreas de aglomerados de recipientes com larvas, indicando que este método pode ser utilizado para aperfeiçoar atividades de vigilância entomológica. Para isso, é necessário que a análise seja feita logo após a realização da atividade, intervindo nas áreas com maiores aglomerados. Para Barcellos e Bastos23, os mapas apresentam didaticamente elementos visíveis do espaço, isto é, sua base física codificada através de sinais e convenções que facilitam sua interpretação. Souza-Santos e Carvalho11 apresentam como maior vantagem do uso de técnicas de análise espacial, a fácil e rápida visualização de localidades expostas a diferentes graus de risco, sem serem afetadas pela divisão político-administrativa existente, bem como a possibilidade de criação de indicadores de riscos pautados em outros parâmetros.

Ainda há poucos trabalhos sobre espacialização da dengue, como verificado por Araújo cols24. Os mesmos autores apontam para a necessidade de avanços na utilização do geoprocessamento, principalmente, nos estudos com vetores da dengue.

Algumas limitações do presente estudo ecológico podem ser atribuídas ao fato de trabalhar com dados secundários, desenvolvidos para o interesse da vigilância e não para pesquisa, o que dificulta a recuperação de algumas informações perdidas. A atividade “Casa a Casa”, utilizada na análise da positividade de recipientes com larvas no município, também, tem suas limitações. Nos períodos de férias de agentes, ou mesmo de mudança no quadro de funcionários, pode haver interrupção desta atividade, bem como nos períodos de epidemia, onde outras atividades, como Controle de Criadouros e Nebulização com equipamento ultrabaixo volume (UBV), precisaram ser realizadas para o controle da transmissão.

Vale destacar, ainda, que estudos descritivos têm sua importância pelo baixo custo e a forma rápida com que os resultados são obtidos, contribuindo para o conhecimento da dinâmica da infestação larvária, que pode ser utilizado por pesquisadores para ajudar na elucidação de questões relacionadas aos vetores da dengue e sua transmissão.

O combate ao Aedes aegypti vem apresentando, devido à complexidade da biologia deste vetor e sua capacidade de adaptação ao ambiente humano, dificuldades técnicas e operacionais para execução de suas atividades, buscando alcançar níveis de infestação compatíveis com a eliminação da transmissão5. Há necessidade de maiores investimentos em metodologias adequadas, buscando sensibilizar a população sobre a necessidade de mudanças de comportamento que objetivem o controle do vetor25. Tauil26 conclui que, no mundo não há experiência, de eliminação de um vetor de doença realizada de forma descentralizada, com direção única em cada nível de governo, a exemplo do preconizado pelo Sistema Único de Saúde brasileiro.

 

CONFLITO DE INTERESSE

Os autores declaram não haver nenhum tipo de conflito de interesse no desenvolvimento do estudo.

 

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 Endereço para correspondência:
MsC. Gerson Laurindo Barbosa
R. Paula Souza 166, Luz
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Tel: 55 11 3311-1112
email: gersonlbarbosa@yahoo.com.br

Recebido para publicação em 30/09/2009
Aceito em 21/01/2010