Home » Volumes » Volume 43 November/December 2010 » Como estruturar um isolamento respiratório com pressão negativa do ar, em instituições hospitalares com alto risco ocupacional, para tuberculose pulmonar?

Como estruturar um isolamento respiratório com pressão negativa do ar, em instituições hospitalares com alto risco ocupacional, para tuberculose pulmonar?

Vania Regina GoveiaI; Silma Maria Cunha Pinheiro RibeiroI; Eduardo Alexandrino Sérvolo de MedeirosII; Antonio Carlos Campos PignatariII

IDepartamento de Enfermagem Básica, Escola de Enfermagem, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG IIDisciplina de Infectologia, Departamento de Doenças Infecciosas e Parasitárias, Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, SP

DOI: 10.1590/S0037-86822010000600036


 

Prezado Editor:

As doenças de transmissão respiratória por aerossóis, como a tuberculose, constituem grave problema de saúde no mundo inteiro, e a disseminação ocorre a partir de partículas aéreas geradas pela tosse ou espirro de pessoas contaminadas1. O risco ocupacional para profissionais da saúde infectarem-se pelo Mycobacterium tuberculosis foi documentado no final da década de 1990 e caracterizado pelo atraso no início do isolamento dos pacientes infectados, bem como práticas assistenciais inadequadas associadas à falha na manutenção do sistema de ventilação e à falta de proteção respiratória2-7.

Um estudo multicêntrico brasileiro identificou alto risco ocupacional para tuberculose com taxa de prova tuberculínica positiva de 63,1%, que foi associada à ausência de medidas de biossegurança nos hospitais8. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) divulgou que apenas 10 hospitais, dentre os 47 de referência do Sistema Único de Saúde (SUS), dispunham de isolamento respiratório com pressão negativa e filtragem HEPA (high efficiency particulate air) do ar9.

Em nosso meio, não há regulamentação ou legislação que oriente os gestores de instituições de saúde para criação e manutenção de isolamento respiratório, apesar das recomendações nacionais e internacionais como uma das medidas de segurança para o controle da disseminação da tuberculose1,10,11.

Independente da regulamentação, consideramos necessária uma avaliação cuidadosa do risco para instituições de saúde, que admitem pacientes com tuberculose pulmonar e consequentemente possuem risco potencial para a sua disseminação. A implantação do isolamento com pressão negativa do ar deve acontecer junto a outras medidas de controle1.

Um hospital de ensino de São Paulo, com aproximadamente 600 leitos, admitia, anualmente, 100 pacientes com tuberculose pulmonar e optou pela implantação de uma unidade de isolamento respiratório com oito leitos, distribuídos em quatro quartos, dotados de controles ambientais do tipo condicionamento do ar com filtragem HEPA e pressão negativa. O número de trocas de ar por hora foi estabelecido em 20 para mover e resfriar o ar, temperatura em 22 ± 2ºC e a pressão negativa pelo balanceamento dos fluxos de exaustão maior do que o insuflamento de ar nos quartos. Manômetros foram instalados, tanto no interior dos quartos, para monitorizar a pressão negativa, como no conjunto de filtros, para o controle de sua saturação.

Durante o período de um ano, foi realizada a monitorização diária da pressão negativa nos quartos por meio da leitura dos manômetros e registro dos valores, a fim de assegurar a proteção dos profissionais da saúde e pacientes. Além disso, um cronograma de manutenção preventiva mensal foi cumprido pelo técnico de engenharia. Em duas ocasiões, de pressão neutra e positiva respectivamente, a manutenção corretiva foi solicitada e a troca dos filtros da exaustão executada pelo referido técnico. As trocas dos filtros, grosso na primeira ocasião e fino na segunda, restauraram a pressão negativa em todos os quartos da unidade de isolamento.

Convém esclarecer que as trocas foram indicadas, tanto pelos manômetros dos quartos indicando pressão neutra ou positiva, como pelo manômetro dos filtros mostrando a saturação. Ao longo do período de 12 meses, o conjunto de filtros da exaustão apresentou saturação, mas o conjunto do insuflamento não se saturou.

Considerando o funcionamento ininterrupto da unidade, a periodicidade de troca dos filtros da exaustão foi estabelecida com a equipe de engenharia da seguinte forma: filtro grosso a cada 3 meses, filtro fino a cada 12 meses e filtro absoluto a cada 20 meses, independente da saturação, como medida preventiva para a manutenção da pressão negativa. Para o conjunto do insuflamento, foi estabelecida a periodicidade de 20 meses.

Com a implantação da unidade de isolamento respiratório, 131 pacientes foram beneficiados. Desses, 103 (78,6%) apresentavam tuberculose pulmonar suspeita ou confirmada e 51 (49,5%) posteriormente confirmadas. Destes 51 pacientes, apenas 25 (49%) foram internados direto no isolamento respiratório. Apesar das recomendações de admissão no isolamento, diante da suspeita de tuberculose pulmonar, 26 (51%) pacientes foram admitidos na unidade somente após permanecerem mais de 24h em outra unidade do hospital, especificamente no pronto-socorro.

O investimento na reforma para instalar a unidade com pressão negativa foi de USD$75.000,00 (setenta e cinco mil dólares) e o contrato de manutenção preventiva mensal bem como as trocas dos filtros tiveram um custo aproximado de USD$550,00 (quinhentos e cinquenta dólares) mensais. Nesta renovação da planta física, optou-se pelo aproveitamento de quatro quartos existentes, incluindo uma sacada externa para a instalação dos equipamentos, em conformidade com as recomendações internacionais. O sistema de ventilação implantado combinou a recirculação do ar com filtragem HEPA, renovação em torno de 20 trocas por hora, pressão negativa no quarto e temperatura de 22ºC para o conforto de pacientes e profissionais.

Os controles ambientais implantados atenderam ao programa institucional de controle de tuberculose. O gerenciamento adequado faz-se necessário para assegurar a proteção dos profissionais da saúde e minimizar os riscos ocupacionais. Recomenda-se a implantação de um sistema de ventilação com pressão negativa para instituições com risco para a transmissão de tuberculose.

 

REFERÊNCIAS

1. Centers for Disease Control and Prevention. Guidelines for preventing the transmission ofMycobacterium tuberculosis in health-care settings, 2005. MMWR 2005; 54:1-141.         [ Links ]

2. Beck-Sagué C, Dooley SW, Hutton MD, Otten J, Breeden A, Crawford JT, et al. Hospital outbreak of multidrug-resistant Mycobacterium tuberculosis infections. JAMA 1992; 268:1280-1286.         [ Links ]

3. Edlin BR, Tokars JI, Grieco MH, Crawford JT, Williams J, Sordillo EM, et al. An outbreak of multidrug-resistant tuberculosis among hospitalized patients with the acquired immunodeficiency syndrome. N Engl J Med 1992; 326: 1514-1521.         [ Links ]

4. Haas DW, Milton S, Kreiswirth BN, Brinsko VL, Bifani PJ, Schaffner W. Nosocomial transmission of a drug-sensitive W-variant Mycobacterium tuberculosis strain among patients with acquired immunodeficiency syndrome in Tennessee. Infect Control Hosp Epidemiol 1998; 19:635-639.         [ Links ]

5. Pearson ML, Jereb JA, Frieden TR, Crawford JT, Davis BJ, Dooley SW, et al. Nosocomial transmission of multidrug-resistant Mycobacterium tuberculosis: a risk to patients and health care workers. Ann Intern Med 1992; 117:191-196.         [ Links ]

6. Ridzon R, Kenyon T, Luskin-Hawk R, Schultz C, Valway S, Onorato IM. Nosocomial transmission of human immunodeficiency virus and subsequent transmission of multidrug-resistant tuberculosis in a healthcare worker. Infect Control Hosp Epidemiol 1997; 18:422-423.         [ Links ]

7. Joshi R, Reingold AL, Menzies D, Pai M. Tuberculosis among health-care workers in low and middle-income countries: a systematic review. PLoS Med 2006; 3:e494.         [ Links ]

8. Roth VR, Garrett DO, Laserson KF, Starling CE, Kritski AL, Medeiros EAS. A multicenter evaluation of tuberculin skin test positivity and conversion among health care workers in Brazilian hospitals. Int J Tuberc Lung Dis 2005; 9:1335-1342.         [ Links ]

9. Parenti CF, Purificação MDS, Santos AAM, Nogueira MAA, Gomes SMT. Diagnóstico da situação das unidades de isolamento respiratório dos hospitais de referência para atendimento de casos de Síndrome Respiratória Aguda Grave [Internet]. Brasília. Agência Nacional de Vigilância Sanitária; 2006. [Acesso 11 jan 2009]. Disponível em:http://www.abev.com.br/controledeinfeccao/temaslivres/poster/id786.doc/.         [ Links ]

10. Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia. II Consenso Brasileiro de Tuberculose. Diretrizes Brasileiras para Tuberculose 2004. J Bras Pneumol 2004; 30 (supl1):1-56.         [ Links ]

11. Ministério da Saúde. Manual de Recomendações para o Controle da Tuberculose no Brasil. Programa Nacional de Controle da Tuberculose 2010 [Internet]. Brasília. Secretaria de Vigilância em Saúde; 2006. [Acesso 30 ago 2010]. Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/manual_de_recomendacoes_controle_tb_novo.pdf/.         [ Links ]

 

 

 Endereço para correspondência:
Dra. Vania Regina Goveia
ENB/EE/UFMG
Av. Alfredo Balena 190, 30130-100 Belo Horizonte, MG
Tel: 55 31 3409-9854
e-mail: vaniagoveia@uol.com.brvaniagoveia@ufmg.br

Recebido para publicação em 28/01/2010
Aceito em 06/10/2010