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Efeito da água de criação larval na oviposição de Aedes aegypti em laboratório

Lígia Leandro Nunes SerpaI; Simone D'Cara Barbosa MonteiroI; Júlio Cesar VoltoliniII

ISeção Técnica de Pesquisa em Vetores, Superintendência de Controle de Endemias, Taubaté, SP IIDepartamento de Biologia, Universidade de Taubaté, Taubaté, SP

DOI: 10.1590/S0037-86822008000500017


RESUMO

Para avaliar a influência da água de criação larval na oviposição de Aedes aegypti, quatro tipos de águas foram oferecidos a fêmeas grávidas. Foram observados mais ovos na água de criação larval mista (2.837) do que na água de Aedes albopictus (690) e controle (938) porém, semelhante à Aedes aegypti (2.361).

Palavras-chaves: Aedes aegypti. Aedes albopictus. Oviposição. Estimulante. Feromônio.


ABSTRACT

To evaluate the influence of larval rearing water on Aedes aegypti oviposition, four types of water were provided for gravid females. It was observed that more eggs were laid in the mixed larval rearing water (2,837) than in the Aedes albopictus water (690) or control water (938), but that this number was similar to what was seen in the Aedes aegypti water (2,361).

Key-words: Aedes aegypti. Aedes albopictus. Oviposition. Stimulant. Pheromone.


 

 

O sucesso reprodutivo de mosquitos está intimamente relacionado à seleção do local de oviposição, fator crítico para a sobrevivência e dinâmica de populações que influencia a distribuição larval em campo e é resultante da interação de uma complexa rede de fatores químicos e físicos, envolvendo respostas visuais, táticas e olfatórias2.

Em Aedes aegypti, vetor dos vírus da dengue e sério problema de saúde pública no mundo, o comportamento de oviposição de fêmeas grávidas sofre a influência de fatores como a umidade, luminosidade, substrato e propriedades da água4 7. Diferentes autores verificaram que substâncias químicas de origem larval ou dos ovos tornam o ambiente aquático co-específico mais estimulante à deposição dos ovos1 12. Mendki e cols5 isolaram e identificaram em Aedes aegypti o semioquímico de origem larval heneicosane, estimulante na oviposição desta espécie. Outros fatores químicos presentes na água de criação que estimulam a oviposição de Aedes aegypti são substâncias de origem larval heteroespecífica1 13 e, presença de bactéria9.

Elucidar o comportamento de oviposição de fêmeas grávidas de Aedes aegypti é um componente básico necessário com implicações nas atividades de vigilância e controle. Assim, o objetivo do presente estudo foi avaliar, em laboratório, o efeito da água de criação larval de culturas puras de Aedes aegypti, Aedes albopictus e cultura mista pelas duas espécies na oviposição de fêmeas grávidas de Aedes aegypti.

A colônia de Aedes aegypti mantida pelo Laboratório de Pesquisa da Superintendência de Controle de Endemias – Serviço Regional 3, Taubaté, foi obtida do município de Potim, Vale do Paraíba, São Paulo-Brasil. Os experimentos foram realizados durante o mês de maio de 2005, em temperatura ambiente variando entre 22,5ºC a 26,9°C, 87% UR e fotoperíodo de 14:12 (L:E) h. Adultos de Aedes aegypti, foram obtidos de ovos da geração F1 a partir de larvas criadas na densidade 1 larva/3,5ml de água destilada e alimentadas com ração para peixes tropicais6. Machos e fêmeas, recém-emergidos foram mantidos em gaiolas teladas na proporção de 2:1, visando garantir a cópula, continuamente alimentados com solução de mel a 10% e fatia de maçã madura. No terceiro e quarto dias de idade foi oferecida cobaia Guinea pig, por 3 horas consecutivas, para a alimentação sanguínea das fêmeas.

Cada unidade experimental foi composta por dez fêmeas grávidas de sete dias de idade. A gaiola (60x60x60cm) foi envolta por papel de filtro, exceto em sua face superior. Foram oferecidos para deposição dos ovos, quatro recipientes de vidro (60ml) revestidos internamente com papel de filtro, cada um contendo 20ml da solução a ser testada. Esta, proveniente da criação larval na densidade de 1 larva/3,5ml de água destilada, alimentadas com ração para peixes tropicais6, sem renovação de água, e utilizadas, após ser filtrada, em papel de filtro, no quinto dia de desenvolvimento (terceiro e quarto estádio). Foram testados quatro tipos de água: água destilada (controle) água de criação larval de culturas puras de Aedes aegypti, Aedes albopictus e cultura mista pelas duas espécies, na gaiola, disponibilizados simultaneamente. O experimento foi repetido 17 vezes com duração de vinte e quatro horas, período durante o qual não foi fornecida alimentação açucarada. Para comparar o número de ovos dos quatro tipos de água utilizamos a análise de variância não paramétrica de Kruskal-Wallis e o teste de Dwass-Steel-Chritchlow-Fligner para comparações múltiplas (α < 0,05).

Fêmeas grávidas de Aedes aegypti realizaram postura nos quatro diferentes tipos de água. Entretanto, o número de ovos depositados, entre eles, foi diferente (Figura 1).

 

 

Na água de criação larval mista (Aedes aegypti e Aedes albopictus) o número total de ovos (2.837) foi maior do que no de água de criação larval de Aedes albopictus (690) e controle (938), porém, semelhante a de Aedes aegypti (2.361).

Verificou-se que o número de ovos depositados na água de criação larval de Aedes aegypti foi maior quando comparado a de Aedes albopictus e controle. Todavia, o teste estatístico indicou diferença para água de criação larval de Aedes albopictus e semelhança com o controle. Houve também semelhança entre o a água de criação larval de Aedes albopictus e o controle.

Neste estudo, verificou-se que os quatro tipos de água aos quais as fêmeas foram expostas estimularam a oviposição. Entretanto, a mesma foi mais estimulada no recipiente de água de criação larval mista e de Aedes aegypti. A atividade de oviposição de fêmeas de Aedes aegyptiparece ser mediada pela presença de semioquímico na água de criação12.

Segundo Bentley e Day2, embora substâncias estimulantes e atrativas de origem larval possam, em alguns casos, ser feromônios, deve-se considerar também a possibilidade de serem oriundas de material fecal ou de metabólitos microbianos.

Em nosso trabalho, a água de criação larval foi filtrada o que, possivelmente, permitiu a remoção de microorganismos reduzindo os efeitos destes na atividade de oviposição de Aedes agypti 9. Além disso, o fator de superpopulação larval, mecanismo regulador considerado menos favorável a oviposição, que atua como inibidor produzido pela larva, ou ainda, resultante de excesso de produto excretório2, pode ser descartado no presente estudo uma vez que a densidade na qual as larvas se desenvolveram (1l/3,5ml) não é considerada alta5 11.

A interferência positiva co-específica na oviposição de fêmeas de Aedes aegypti, como verificado no presente estudo foi anteriormente registrada nesta e outras espécies de Culicidae3 10 14. No que tange a resposta oviposicional heteroespecífica, o presente estudo revelou poucos ovos depositados na água de criação larval de Aedes albopictus. Já o número de ovos depositados na água de criação larval mista foi estatisticamente significativo. Segundo Sucharit13, sob condições de pouco alimento, o convívio destas duas espécies no criadouro pode ocasionar a eliminação gradativa de Aedes albopictus.

Na presente pesquisa, não houve diferença estatística entre o número de ovos depositados nos recipientes de água de criação larval de Aedes aegypti e o controle, porém, aquela revelou tendência a ser mais estimulante. À semelhança do observado por Allan e Kline1, a oviposição de fêmeas grávidas de Aedes aegypti em água de criação larval co-específica não diferiu do controle. Esses mesmos autores observaram ainda preferência por recipiente com água de criação larval de Aedes albopictus.

A seleção por parte de fêmeas grávidas de Aedes aegypti por recipiente contendo água de criação larval co-específica e mista sugere preferência, no primeiro caso, por criadouros pré-existentes desta espécie e, no segundo, tentativa em reduzir os efeitos da competição intra-específica. Tais informações são de relevância, pois estão relacionadas à dispersão e abundância do Aedes aegypti, conseqüentemente, a propagação do dengue.

 

REFERÊNCIAS

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 Endereço para correspondência:
Msc Lígia Leandro Nunes Serpa
Seção Técnica de Pesquisa em Vetores/SUCEN
Praça Coronel Vitoriano 23, Jardim Santa Clara
12020-020 Taubaté, SP
Tel: 55 12 3632-7616
e-mail: ligiaserp@sucen.sp.gov.br

Recebido para publicação em 19/03/2008
Aceito em 27/08/2008