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Avaliação da presença de Staphylococcus aureus nos leitos do Centro de Terapia Intensiva do Hospital Escola da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro, em relação à posição no colchão antes e após a limpeza

Guilhermo Justino MundimI; Roberto Alexandre DezenaI; Ana Carolina Santana de OliveiraI; Paulo Roberto da SilvaI; Marilda CardosoII; Gilberto de Araújo PereiraII; César Augusto de MoraisI; Ana Paula Sarreta TerraI

IDisciplina de Microbiologia do Departamento de Ciências Biológicas da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro IICentro de Graduação em Enfermagem da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro, Uberaba, MG

DOI: 10.1590/S0037-86822003000600007


RESUMO

Através de meios de cultura, foi pesquisada a posição de colônias de Staphylococcus aureus em colchões, visando avaliar a eficácia do procedimento de limpeza e desinfecção dos leitos do Hospital Escola da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro (Uberaba). Foram analisadas amostras de 50 colchões no período de 22 de outubro de 2000 a 16 de janeiro de 2001. As amostras foram coletadas e semeadas, pela técnica de esgotamento, em dois meios de cultivo (ágar sangue e manitol) com posterior realização de provas de catalase e coagulase . Na análise estatística, foram utilizados os testes não paramétricos Mann-Whitney, Kruswkal- Wallis e Wilcoxon Matched Pairs Test com nível de significância p < 0,05. Foram utilizadas 600 placas de meio de cultivo. Houve crescimento em 94 (15,6%), sendo 82 (87,2%) antes e 12 (12,8%) após a limpeza e desinfecção. Em relação à posição no leito, as amostras semeadas no meio de cultivo com manitol mostraram que não houve redução significativa na posição inferior do leito (p>0,05). Os resultados apontam e alertam para falhas no procedimento de limpeza e desinfecção dos leitos hospitalares por nós estudados.

Palavras-chaves: Staphylococcus aureus. Centro de Terapia Intensiva. Infecção hospitalar. Limpeza. Desinfecção.


ABSTRACT

By means of culture medium, it was researched the position of the colony of Staphylococcus aureus on the mattress, to evaluate the efficciuoness of the methods of cleaning and disinfection of the river bed in the Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro’s School Hospital (Uberaba). It were evaluated fifty mattresses on the period of October 22th (2000) to January 16th (2001). The samples were collected and grown, the exhaustion techinique draining, on two different nutrient bases (blood agar and mannitol salt agar) followed by catalase and coagulase tests. For the statistical analysis, were used non-parametrics tests Mann-Whitney, Kruskal-Wallis, Wilcoxon Matched Pairs Test with significance level p < 0,05 were used. Six hundred dishes of culture medium have been used. There was growing in 94 (15,6%), being 82 (87,2%) before and 12 (12,8%) after cleaning and disinfection. Concerning the position on the bed, the samples obtained from mannitol salt agar medium showed significant retention on the lower position of bed. The results alert to flaws in the procedure for cleaning and disinfection from the mattresses studied by us.

Key-words: Staphylococcus aureus. Intensive Care Unit. Hospital’s infection. Cleaning. Disinfection.


 

 

As infecções hospitalares representam um grave problema médico-social e o seu melhor conhecimento, prevenção e controle constituem um desafio a ser enfrentado. Entre os microrganismos associados à etiologia dessas infecções, o Staphylococcus aureus permanece como importante patógeno, sendo responsável por mais de 30% dos casos de infecções hospitalares2. Nos hospitais, os reservatórios são representados por pacientes colonizados, funcionários e pelo próprio ambiente5.

Vários fatores relativos a cada elemento da tríade ecológica fundamental (hospedeiro-agente-ambiente) contribuem para a prevalência e a difícil controle destes tipos de infecção7. Em relação ao hospedeiro, verifica-se a existência cada vez maior do número de doentes com defesas diminuídas, seja devido à idade avançada, seja devido as múltiplas doenças subjacentes ou terapêuticas depressoras do sistema imune. Como fatores contribuintes, salienta-se o uso crescente de procedimentos invasivos, tais como catéteres venosos, centrais e arteriais, diálise, ventilação mecânica e intervenções cirúrgicas em doentes, que há alguns anos não apresentavam condições para tal3. O principal reservatório de Staphylococcus aureus é o homem, sendo comum a infecção cruzada entre os seres humanos, ocorrendo tanto por via aérea, como precedendo resultar do contato direto com pessoas e objetos inanimados1. Além disso, segundo Steere9, cerca de 60% dos adultos são portadores intermitentes, permanecendo obscuros os fatores que controlam a dinâmica da condição de portador. Sua resistência a antimicrobianos é um grave problema, alvo de grande preocupação, tendo este se tornado uma importante causa de infecções piogênicas6 8.

O único Staphylococcus que produz coagulase é o aureus. Entretanto, a produção de coagulase e beta hemólise são duas características que associam os estafilococos à virulência, embora a primeira pareça ser mais confiável. A capacidade da maioria das cepas de S. aureus de fermentar o manitol é uma característica utilizada por muitos microbiologistas para sua identificação9 10 11. Com relação ao ambiente, salientam-se fatores institucionais, tais como o relacionamento doente/pessoal de saúde e unidades de cuidados intensivos médicos e cirúrgicos4.

Este trabalho avalia a presença e a posição das colônias de S. aureus nos leitos do Centro de Terapia Intensiva (CTI) do Hospital Escola (HE) da Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro (FMTM), antes e após a limpeza.

 

MATERIAL E MÉTODOS

Foram avaliadas amostras obtidas de 50 colchões do CTI/HE/FMTM, coletadas no período de 22/10/2000 a 16/01/2001, a partir de swabs estéreis umidecidos em soro fisiológico estéril, por rolamento nas três áreas (superior, média e inferior) da superfície em contato com o paciente. As amostras foram colocadas em caldo Brain Heart Infusion (BHI) e semeadas em meio de cultivo ágar sangue e manitol.

Estas amostras foram coletadas imediatamente após a desocupação dos leitos, sendo obtidas uma de cada área. Após desinfecção dos leitos usando água, sabão e álcool 70%, foi realizada uma nova coleta. Depois de coletadas, as amostras foram incubadas em estufa por 30 minutos em caldo BHI e, em seguida, semeadas pela técnica de esgotamento em meio de cultivo ágar sangue e manitol e incubadas a 37ºC durante 24 a 48 horas.

As amostras que revelaram a presença de colônias de cocos com características sugestivas de S. aureus foram reisoladas em novo ágar BHI e, após 24 horas a 37ºC, submetidas à prova de catalase e coagulase. Todas as colônias que apresentaram características compatíveis com Staphylococcus aureus foram submetidas à confirmação microscópica após coloração pelo método de Gram.

A caracterização das amostras de Staphylococcus aureus foi realizada pela evidenciação de provas de coagulase positiva, catalase e fermentação em manitol. As amostras cujas provas de coagulase em tubo mostraram-se duvidosas foram submetidas à prova de coagulase, em lâminas com hemácias de carneiro, previamente sensibilizada com hemolisina e fibrinogênio (Staphy-Test, Probac do Brasil).

Na análise estatística, foram utilizados os testes não paramétricos Mann-Whitney, Kruskal-Wallis e Wilcoxon Matched Pairs Test com nível de significância p<0,05.

 

RESULTADOS

Observou-se que dos 50 colchões avaliados, com 600 placas de cultivo, houve crescimento de S. aureus em 94 (15,6%), sendo 82 (87,2%) antes e 12 (12,8%) depois da limpeza e desinfecção.

De acordo com o teste não paramétrico de Mann-Whitney, tanto antes quanto após limpeza e desinfecção do leito, o número de S. aureus era sempre menor que de outros cocos Gram positivos (p<0,05).

Com o teste Kruskal-Wallis, pode-se notar que tanto o número de colônias quanto as provas de coagulase positivas, não apresentaram diferença significativa entre as regiões superior, média e inferior do colchão quando analisadas, separadamente, antes e após a limpeza e desinfecção.

Em meio ágar sangue, de acordo com Wilcoxon Matched Pairs Test, houve redução significativa no número de colônias de S. aureus em todas as posições do colchão: sendo a superior (p=0,033); a média (p=0,009); e a inferior (p=0,030) (Figura 1). Confirmando esse padrão, as provas de coagulase das amostras obtidas de meio ágar sangue também mostraram redução significativa em todas as posições do colchão, sendo a superior (p=0,006); a média (p=0,003) e a inferior (p=0,026).

 

 

Já em meio manitol, de acordo com Wilcoxon Matched Pairs Test, houve redução significativa no número de colônias de S. aureus nas posições superior (p=0,007) e média (p=0,012) dos colchões, após a limpeza e desinfecção. Na posição inferior, não houve redução significativa no número de colônias, sendo (p=0,082) (Figura 2). O número de provas de coagulase, de amostras obtidas em meio ágar manitol, também apresentou padrão semelhante, tendo redução significativa nas posições superior (p=0,005) e média (p=0,019) não houve redução significativa na posição inferior (p=0,050469).

 

 

DISCUSSÃO

Pode-se notar que as colônias de S. aureus, provenientes de meio ágar manitol, aumentaram progressivamente da posição superior para posição inferior, após a limpeza e desinfecção. Além disto, em posição inferior, evidenciou-se uma redução não significativa p>0,05. O meio cultivo manitol, por si só, já é seletivo para S. aureus. O que corrobora tais resultados é o padrão semelhante encontrado nas provas de coagulase, aumento progressivo do número de provas positivas de regiões superior para inferior culminando com redução não significativa em posição inferior p>0,05. Associando o fato do meio de cultivo manitol ser seletivo para S. aureus e a prova de coagulase ser específica para identificação presuntiva dessa espécie bacteriana, inferiu-se que após a desinfecção e limpeza, as colônias de S. aureus, quando presentes, estavam sendo deslocadas para posições inferiores dos colchões. Aparentemente, os colchões estavam sempre sendo limpos da posição superior para inferior, independente do paciente que tivera ocupado o leito e sua doença.

Era de se esperar que o comportamento do número de provas de coagulase positivas e do número de colônias de S. aureus, obtidas de meio ágar sangue, fossem semelhantes ao obtido do ágar manitol já que, em cada coleta, a amostra para ambos os meios de cultivo era a mesma. Além disto, por ser um meio rico, o ágar manitol facilita ainda mais o crescimento dessa bactéria. O que pode explicar essa divergência de resultados é o fato de ter havido crescimento de outros microorganismos em meio ágar sangue, tais como outros cocos gram positivos, fungos e bacilos gram negativos, em quantidade suficiente para interferir no crescimento de S. aureus. Além disto, devido ao grande número de microrganismos, a triagem realizada pela identificação morfológica por observação microscópica pode ter sido prejudicada. Com base nestes dados, podemos inferir que o meio de cultivo ágar sangue não se mostrou eficiente para os propósitos preconizados por esse trabalho.

É importante salientar que os resultados obtidos do meio ágar manitol, e confirmados pelas provas de coagulase, refletem a necessidade de uma reavaliação criteriosa nos procedimentos de limpeza e desinfecção atualmente empregados nos colchões. Embora o objetivo deste trabalho tenha sido somente relacionado ao S. aureus, outros microrganismos tão patogênicos quanto essa bactéria podem estar apresentando o mesmo padrão de comportamento já descrito, por outros autores. Os autores concluem ser imprescindível que o processo de desinfecção, nos leitos hospitalares, deva ser realizado de acordo com a necessidade e não segundo critérios pré-determinados.

 

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 Endereço para correspondência
Dra. Ana Paula Sarreta Terra
Disciplina de Microbiologia/DCB /FMTM
Praça Manoel Terra s/n, 38015-050
Uberaba, MG, Brasil
Tel: 34 3318-5480; Fax: 34 3318-5462
E-mail: csarreta@terra.com.br

Recebido para publicação em 8/4/2002
Aceito em 10/11/2003