Home » Volumes » Volume 32 May/June 1999 » Hepatite C em doadores de sangue: diagnóstico por transcrição reversa e reação em cadeia da polimerase (RT-PCR) e sua correlação com os testes imunoenzimáticos (EIA) e imunoblot recombinante (RIBA)

Hepatite C em doadores de sangue: diagnóstico por transcrição reversa e reação em cadeia da polimerase (RT-PCR) e sua correlação com os testes imunoenzimáticos (EIA) e imunoblot recombinante (RIBA)

Neiva Sellan Lopes Gonçales

Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas

DOI: 10.1590/S0037-86821999000300016


No Brasil, previne-se a transmissão por transfusão sangüínea do vírus da hepatite C com a triagem dos doadores de sangue realizada por meio da pesquisa do anti-VHC pelo método de EIA e dosagem dos níveis séricos da ALT. A especificidade da triagem do anti-VHC por EIA, em populações de baixa soroprevalência, tem sido questionada. Assim, para avaliar-se a eficácia desta triagem, pesquisou-se a presença, com o uso da RT-PCR, do RNA viral em amostras de doadores de sangue, procurando-se, também, estabelecer as associações entre os resultados desta reação e os testes de EIA e RIBA. Procurou-se, ainda, detectar marcadores teciduais para o VHC, com a utilização de um anticorpo monoclonal específico, pela técnica de imuno-histoquímica e imunofluorescência em cortes de tecido hepático parafinado. Foram estudadas 196 amostras de soro, coletadas no período de janeiro de 1994 a dezembro de 1995. Entre estas, 178 foram selecionadas de uma população de doadores de sangue voluntários do Centro de Hematologia e Hemoterapia da UNICAMP e, 18 de pacientes atendidos no Ambulatório do Grupo de Estudos das Hepatites da Disciplina de Doenças Infecciosas e Parasitárias da Faculdade de Ciências Médicas desta Universidade. Dos 178, 147 (82,6%) apresentaram-se à triagem com resultados repetidamente reagentes para o anti-VHC e não-reagentes para o HBsBAg, anti-HBc, anti-HIV1/2, anti-HTLVI/II, além de serem negativos para marcadores da Doença de Chagas e sífilis. Os 31 (17,4%) restantes eram repetidamente negativos para todos os marcadores sorológicos acima citados e apresentavam níveis de ALT normais (grupo controle). As 18 amostras de pacientes estudadas eram negativas para a pesquisa do anti-HIV1/2 e foram investigadas sorologicamente para os diferentes tipos de hepatites, de acordo com a avaliação clínica. Os 147 doadores foram subagrupados de acordo com os critérios baseados nas leituras das densidades ópticas das amostras em relação ao cutoff (DO/C) do teste de EIA para o anti-VHC e o nível de ALT. A seqüência do RNA do VHC foi detectada pela RT- nested PCR, utilizando-se primers da região 5’não-transcrita, que é a mais conservada do genoma viral. O ensaio de imunnoblot recombinante (RIBA-2) também foi realizado nas mesmas amostras. No subgrupo considerado EIA fortemente reagente, 95,4% apresentaram aumento nos níveis séricos de ALT, enquanto no subgrupo EIA fracamente reagente apenas, 47,1% tiveram níveis de ALT elevados. No subgrupo EIA fortemente reagente houve 96,9% de co-positividade com o teste de RIBA. A realização deste mostrou-se necessária para definir a condição sorológica dos indivíduos EIA fracamente reagente, uma vez que apenas 53% confirmaram a positividade inicial, permanecendo 23,5% como indeterminados e 23,5% como negativos. Observou-se uma relação direta entre a reatividade contra o antígeno do core do VHC (c22.3) e a presença de partículas virais no soro. Entre os RIBA indeterminados (reativos apenas para o c22.3), 87,5% apresentaram positividade para a RT-PCR. Em 91,5% dos indivíduos com EIA fortemente reagente, detectou-se o RNA do VHC pela RT-PCR contra apenas 17,6% no subgrupo EIA fracamente reagente. A concordância entre os resultados positivos de RIBA e RT-PCR foi de 85,9%. Por estes achados conclui-se que os dois testes devam ser aplicados isolados ou seqüencialmente para confirmar a infecção pelo VHC particularmente em populações com baixas prevalências da mesma, como é o caso dos doadores de sangue. Entre os indivíduos com hepatite crônica histologicamente confirmada não se encontrou nenhum caso com resultado de RIBA negativo. Em 92,3% deste grupo observou-se positividade para o RNA do VHC pela RT-PCR. Os testes de EIA e RIBA utilizados neste estudo apresentaram alta sensibilidade e especificidade, considerando-se como população positiva aqueles indivíduos com diagnósticos histopatológicos de hepatites crônicas, com positividade para a RT-PCR. Assim, conclui-se que a triagem sorológica, em nosso serviço, para prevenir a transmissão do VHC, na transfusão de sangue, mostrou-se eficiente e capaz de selecionar os doadores infectados, principalmente se for usada como critério a relação DO/C no teste de EIA. A utilização do anticorpo monoclonal específico, TORDJI-22, em tecido hepático parafinado pela técnica de imuno-histoquímica ou imunofluorescência, não permitiu evidenciar a presença do VHC neste tecido em nossa casuística. Os testes de triagem sorológica (EIA e RIBA) associados ao método de RT-PCR e ao diagnóstico anátomo-patológico propiciarão ao clínico manipular melhor as inter-relações e as variáveis envolvidas na infecção pelo vírus C.

 

Hepatitis C infection in blood donors: diagnosis of hepatitis C virus by a reverse transcriptase nested polymerase chain reaction (RT-PCR) and correlation with the enzyme immunoassay (EIA) and recombinant protein immunoblot assay (RIBA) status

The transmission of hepatitis C virus in Brazil is currently monitored either by an anti- HCV EIA or by the determination of ALT serum levels. However the specificity of the anti-HCV EIA method in low seroprevalence populations has been questioned. In order to evaluate the efficiency of this test, blood samples were screened for the presence of viral RNA using RT-PCR and the results then compared with those of the EIA and RIBA. Immunohistochemistry and immunofluorescence of paraffin embedded hepatic tissue were employed to detect HCV tissue markers using a specific monoclonal antibody. A total of 178 serum samples obtained from voluntary blood donors at the Hematology and Hemotherapy Center (UNICAMP) and 18 samples from patients who were attended by the Hepatitis Group of the Infectious and Parasitic Diseases Unit between January, 1994 and December, 1995. One hundred and forty-seven samples (82.6%) consistently reacted with anti- HCV antibody but not reactive with HBsBAg, anti-HBc, anti-HIV1/2 or anti-HTLVI/II antibodies; these samples were negative for syphilis and Chagas’ disease. The remaining 31 samples (17.4%) were consistently negative for all of the above serological markers and showed normal ALT levels (control group). The 18 samples obtained from patients were negative for anti-HIV1/2 and were serologically studied for different types of hepatitis according to the clinical evaluation. The 147 positive donors were divided into subgroups based on the samples optical density readings for the cutoff (DO/C) anti-HCV EIA test and in their ALT levels. The RNA sequence of HCV was detected by RT- nested PCR using primers from the 5′ non transcribed region which is the most conserved of the viral genome. The RIBA-2 was also performed on these samples. The majority (95.4%) of the samples that gave a strongly reactive EIA result also showed an increase in the serum ALT levels, while only 47.1% of the weakly reactive EIA subgroup had elevated ALT serum level. The co-positivity of the EIA test with the RIBA test in the strongly reactive EIA subgroup was 96.9%. The RIBA test proved to be important and necessary in defining the serological status of the weakly reactive EIA subgroup; thus, 53% of the samples were the EIA positive, 23.5% were negative and in 23.5% was not determined. There was a direct positive relationship between the reactivity to the HCV core (c22.3) and the presence of serum viral particles. Among samples with indeterminate RIBA results (reactive only to c22.3), 87.5% were positive by RT-PCR. HCV-RNA was detected in 91.5% of the strongly reactive EIA samples compared to only 17.6% in the weakly reactive EIA group. There was a high level of agreement (85.9%) the RIBA results and RT-PCR test. Based on this findings, these two tests may be used either separately or sequentially to confirm an HCV infection, particularly in populations where the prevalence of this infection is low (as in the case of blood donors). There was no RIBA negative results in individual with histologically confirmed chronic hepatitis. Using RT-PCR, RNA-HCV was detected in 92.3% this group. Our results showed a high sensitivity and specificity for the EIA and RIBA tests in individuals with a histopathological diagnosis of chronic hepatitis and who were positive by the RT-PCR test. In conclusion, the serological screening for prevent the HCV transmission in blood transfusions as performed in our laboratory is efficient and capable of detecting infected donors, particularly if the DO/C report of the EIA test is used as a criterion. The specific monoclonal antibody TORDJI-22, was unable to detect the presence of HCV in the hepatic tissue evaluated immunohistochemical or immunofluorescent techniques. The EIA and RIBA tests, in association with RT-PCR and anatomic-pathological diagnosis, may be useful in evaluating the relationships and parameters involved in HCV infections.

Neiva Sellan Lopes Gonçales

Tese apresentada à Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas para obtenção do Título de Doutor.

Campinas, SP, Brasil, 1997