Home » Volumes » Volume 30 January/February 1997 » CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DA ANATOMIA PATOLÓGICA E PATOGÊNESE DO MEGACÓLON CHAGÁSICO

CONTRIBUIÇÃO AO ESTUDO DA ANATOMIA PATOLÓGICA E PATOGÊNESE DO MEGACÓLON CHAGÁSICO

Sheila Jorge Adad

DOI: 10.1590/S0037-86821997000100018


Com o objetivo de contribuir para o conhecimento da anatomia patológica e patogênese do megacólon chagásico (MCC), foram estudados intestinos de chagásicos crônicos, com e sem megacólon e de não chagásicos (NC), na transição reto-sigmóide (TRS), porção média do sigmóide (SIG) e transição descendente-sigmóide (TDS). Macroscopicamente, analisaram-se as alterações nas diferentes camadas, o comprimento do sigmóide, o perímetro intestinal, a espessura e a área da túnica muscular. Microscopicamente, além da análise geral, mediram-se as espessuras da muscular da mucosa e das musculares circular e longitudinal; estudou-se imuno-histoquimicamente o exsudato; pesquisou-se T. cruzi; mediram-se pericário, núcleo e nucléolo das células ganglionares; contaram-se neurônios no plexo mientérico (PM); neurônios e gânglios nos plexos submucosos; estudou-se, ainda, a inervação colinérgica através da histoquímica para acetilcolinesterase. As seguintes conclusões sintetizam nossa análise:

. Macroscopicamente, o MCC caracteriza-se por dilatação permanente e aumento da massa muscular na ausência de obstáculo mecânico.

. A caracterização da dilatação torna-se difícil nos casos em que os valores do perímetro externo da alça se sobrepõem aos considerados “normais”. Nesses casos é fundamental avaliar a massa da túnica muscular através de sua área, a qual do ponto de vista prático, pode ser estimada pela análise conjunta do perímetro intestinal e da espessura da muscular.

. A dilatação e o aumento da área da túnica muscular no MCC foram mais intensos na SIG e TRS, em relação à TDS.

. Não houve diferença, estatisticamente significante, entre o comprimento do sigmóide no grupo MCC e nos grupos NC e chagásico sem megacólon (CSMC).

. O espessamento da muscular da mucosa e das musculares circular e longitudinal ocorreu somente nos chagásicos com megacólon.

. Miosite, em geral focal, foi bem mais freqüente e intensa no grupo MCC que no CSMC. Ocasionalmente, adquiriu características granulomatosas.

. Fibrose na túnica muscular foi vista em todos os casos de MCC, predominantemente na TRS e SIG. No grupo CSMC, esse processo foi bem menos freqüente e sem predomínio em qualquer região.

. Dois tipos morfológicos de flebite foram identificados no grupo MCC: necrosante e não necrosante.

. Ganglionite e alterações neuronais do sistema nervoso entérico (SNE), no cólon de chagásicos crônicos, foram focais, ocasionais e sistematizadas, mas não difusas. No grupo MCC eram, em geral, mais freqüentes e intensas que no CSMC e predominaram na TRS e SIG.

. O exsudato, na maioria dos focos inflamatórios do sigmóide de chagásicos crônicos, era constituído, predominantemente, por linfócitos T (CD4+ e CD8+), com escassos linfócitos B, plasmócitos, macrófagos, eosinófilos, neutrófilos e mastócitos.

. O achado de formas amastigotas de T. cruzi ocorreu apenas em 2 (11,8%) casos de MCC, na túnica muscular.

. A hipertrofia neuronal, tanto no plexo submucoso (PS) quanto no PM, foi mais intensa na SIG e TRS e ocorreu apenas no grupo MCC. No PM, pareceu ter relação mais direta com o aumento da área da muscular do que com a redução do número de neurônios.

. A hipertrofia neuronal que ocorreu no MCC gerou um fator de erro na contagem dos neurônios, porque aumentou a probabilidade dessas células serem vistas em um número maior de cortes histológicos, dificultando, assim, estimar a intensidade da denervação.

. A contagem dos gânglios, com mais de 4 neurônios, nos plexos submucosos constituiu um outro parâmetro para avaliar a denervação.

. No MCC o plexo mais lesado foi o PM e dentre os plexos da submucosa, o plexo submucoso externo.

. A redução do número de neurônios no SNE dos chagásicos crônicos foi variável de caso para caso. No PM dos CSMC foi inferior a 50%; no do MCC, em geral, superior a este valor.

. A diminuição do número de neurônios no grupo MCC, tanto no PM como no PS, foi mais intensa na TRS que na SIG e nesta região, em relação à TDS; isso sugere que parte da denervação poderia ser secundária à estase fecal, ou que a denervação na extremidade distal do cólon seria mais importante para desencadear o aparecimento do MCC.

. Na TDS pode não ocorrer dilatação e/ou aumento da área da muscular, mesmo com intensa redução do número de neurônios.

. No grupo MCC observou-se diminuição intensa da inervação colinérgica, sobretudo na túnica muscular na TRS e SIG.

CONTRIBUTION TO THE STUDY OF PATHOLOGY AND PATHOGENESIS OF CHAGASIC MEGACOLON

This work is intended as a contribution to the better knowledge of the pathology and pathogenesis of chagasic megacolon. Bowels from chronic chagasics with and without megacolon and from non-chagasics at the levels rectal-sigmoid transition, mid-sigmoid and descending colon-sigmoid transition were studied. The gross examination analyzed alterations throughout all intestinal layers as well as the sigmoid length, intestinal perimeter, and the muscularis propria area and thickness. In addition to an overall examination, the microscopy included: the thickness measurements of the circular and longitudinal muscularis propria as well as muscularis mucosae thickness measurements; immunohistochemistry of the exsudate cells; T. cruzi search; ganglion cell pericaria, nuclei and nucleoli measurements; counting of myenteric plexus neurons and counting of submucosal plexuses neurons and ganglia; and the study of cholinergic innervation with histochemistry for acethylcholinesterase. The following conclusions synthesize our analysis:

. Grossly the chagasic megacolon is characterized by permanent dilation and increased muscle mass without mechanical obstacle.

. The detection of dilation is difficult for the cases with the bowel external perimeter overlapping the so-called “normal” bowels. For those cases it is fundamental to evaluate the muscle layer mass measuring its cut surface area. The latter might be estimated associating the intestinal perimeter and muscle layer thickness measurements.

. The dilation and muscle layer area increases for the megacolon chagasic group were more severe for mid-sigmoid and rectal-sigmoid transition, when compared with the descending colon-sigmoid transition.

. The sigmoid length for the megacolon chagasic group was not statistically different when compared both with non-chagasics as well as with chagasics without megacolon.

. Muscularis mucosae as well as longitudinal and circular muscularis thickening occurred only for chagasics with megacolon.

. Myositis, which usually was focal in nature, was clearly more common and more severe for the megacolon chagasic group when compared with the no-megacolon chagasic group. It occasionally was granulomatous.

. Muscularis propria fibrosis was noted for all chagasics with megacolon, mainly at rectal-sigmoid transition and mid-sigmoid segments; for the no-megacolon chagasics there was less fibrosis which was distributed randomly.

. Necrotizing and non-necrotizing phlebitis were noted for chagasics with megacolon.

. For chronic chagasics ganglionitis and enteric nervous system neuronal alterations were focal, occasional and systematized, but not diffuse. For the megacolon chagasic group they were usually more frequent and more severe when compared with the no-megacolon chagasic group. They occurred mainly at rectal-sigmoid transition and mid-sigmoid.

. The exsudate for most of the inflammatory foci at the sigmoid of chronic chagasics was mainly made up with CD4 + and CD8+ T-lymphocytes. There were also scant B-lymphocytes, plasma cells, macrophages, eosinophilic and neutrophilic leukocytes and mast cells.

. Amastigotes of T. cruzi were found at muscularis propria of only 2 (11,87%) cases of chronic chagasics with megacolon.

. Neuronal hypertrophy both for the submucosal plexus as well as for the myenteric plexus was more severe at mid-sigmoid and rectal-sigmoid transition. It occurred only for the megacolon chagasic group. For the myenteric plexus it seemed to better correlate with muscle area increase than with decreased neuronal count.

. The neuronal hypertrophy occurring at chagasic megacolon introduced an error factor for the neuronal counts. It increased the probability of those cells appearing on subserial sections hindering the estimation of denervation.

. An additional parameter to evaluate submucosal plexuses denervation was the counting of ganglia with more than 4 neurons.

. The myenteric plexus was the one with the severest lesions for chagasic megacolons; among the submucosal plexuses the external was the one with the severest lesions.

. The lowered enteric nervous system neuronal counts for chronic chagasics was variable for every next case. For no-megacolon chagasic group the neuron counts were reduced but higher than 50% of the control levels. For the megacolon chagasic group the counts were usually lower than 50% of the control levels.

. The decreased neuronal counts for the megacolon chagasic group both for myenteric and submucous plexus were lower at rectal-sigmoid transition when compared with the mid-sigmoid. They were also lower at the latter segment when compared with the descending colon-sigmoid transition. These findings suggest that part of the denervation either might be due to fecal stasis or that the rectal-sigmoid transition denervation might be the most important one to trigger the development of chagasic megacolon.

. Dilation and/or muscle area increase may not occur at descending colon-sigmoid transition even with severe neuronal count reduction.

. The cholinergic innervation was severely decreased for the chagasic megacolon group especially at the muscularis propria both at rectal-sigmoid transition as well as at mid-sigmoid.

Sheila Jorge Adad

Tese apresentada à Faculdade de Medicina do Triângulo Mineiro para obtenção do título de Doutor.
Uberaba, MG, Brasil, 1996.

Recebido para publicação em 21/11/96.