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Avaliação da contaminação de hortas produtoras de verduras após a implantação do sistema de fiscalização em Ribeirão Preto, SP

Osvaldo M. TakayanaguiI; Divani M. CapuanoII; Carlos A. D. OliveiraIII; Alzira M.M. BergaminiII; Madalena H.T. OkinoII; Ana A.M.C. Castro e SilvaIV; Maria A. OliveiraII; Eliana G.A. RibeiroII; Angela M.M. TakayanaguiV

IDepartamento de Neurologia, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP IILaboratório I de Ribeirão Preto, Instituto Adolfo Lutz, Ribeirão Preto, SP IIIDivisão de Vigilância Sanitária, Secretaria da Saúde do Município de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, SP IVDivisão de Vigilância Epidemiológica, Secretaria da Saúde do Município de Ribeirão Preto, Ribeirão Preto, SP VDisciplina de Saúde Pública, Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP

DOI: 10.1590/S0037-86822007000200020


RESUMO

O estudo avaliou a contaminação microbiológica e parasitológica de 88 hortas produtoras de verduras, das quais 47 haviam sido investigadas anteriormente. A taxa de contaminação foi de 38,3% nas hortas previamente investigadas e de 43,9% nas novas hortas. A segurança alimentar requer um contínuo e eficiente sistema de vigilância sanitária das hortas.

Palavras-chaves: Horta. Verdura. Água de irrigação. Segurança alimentar. Cisticercose. Parasitas.


ABSTRACT

This study evaluated the microbiological and parasitological contamination of 88 market gardens producing green vegetables, of which 47 had been investigated previously. The contamination rate was 38.3% in the market gardens previously evaluated and 43.9% in the new market gardens. Food safety requires a continuous and efficient sanitary surveillance system for market gardens.

Key-words: Market garden. Green vegetable. Irrigation water. Food safety. Cysticercosis. Parasites.


 

 

A contaminação de alimentos constitui um sério problema de saúde pública. Segundo o Centers for Disease Control and Prevention (CDC)4, entre as principais causas do aumento das doenças transmitidas por alimentos, está a mudança dos hábitos alimentares com a preferência pelos alimentos frescos e in natura4. Dentro das ações do Programa de Controle da Cisticercose de Ribeirão Preto, SP, a Secretaria Municipal da Saúde implantou a fiscalização das condições higiênico-sanitárias das hortas12. O objetivo deste estudo foi avaliar a contaminação microbiológica e parasitológica de hortas produtoras de verduras de Ribeirão Preto, SP, na vigência da fiscalização.

No período de fevereiro de 2000 a setembro de 2001, foram colhidas, pela Vigilância Sanitária Municipal, 103 hortaliças e suas respectivas águas de irrigação provenientes de 88 hortas produtoras de verduras. Destas, 47 hortas já haviam sido avaliadas em estudos anteriores e 41 não tinham sido submetidas a qualquer análise prévia. Amostras da água de irrigação foram recolhidas em frascos esterilizados de 250mL para a análise microbiológica. Para a investigação parasitológica, foram coletados 2 litros em frascos limpos. Foi também realizada a coleta aleatória de 2 pés de verduras de folha do canteiro, preferencialmente a alface (Lactuca sativa) ou, na sua ausência outra hortaliça folhosa. As verduras foram acondicionadas individualmente em sacos plásticos de primeiro uso, sem contato manual. A análise microbiológica das hortaliças foi fundamentada na determinação do número mais provável (NMP/g) de coliformes a 45°C e na pesquisa de Salmonella spp, de acordo com APHA2. A contagem de coliformes a 45°C foi realizada em 67 amostras de hortaliças. A análise parasitológica da hortaliça foi realizada segundo Marzochi8com modificações de acordo com Takayanagui e cols12. A água de lavagem das hortaliças foi deixada em repouso em cálices cônicos por 24 horas após filtragem em gaze de 8 dobras. As águas de irrigação foram homogeneizadas e transferidas para cálices cônicos de vidro, deixando-se sedimentar por no mínimo 24 horas. Os sedimentos obtidos foram analisados ao microscópio óptico por exame direto e após centrífugo-flutuação em sulfato de zinco (d = 1.180). Na análise microbiológica da água de irrigação, foi avaliado o NMP de coliformes a 45°C/100mL, de acordo com APHA3. A análise estatística foi baseada no teste de McNemar para amostras correlacionadas, adotando p <0,05 como nível de significância.

A presença de coliformes a 45°C, Salmonella e/ou parasitas foi detectada em 36 (40,9%) das 88 hortas produtivas. Das 103 águas de irrigação analisadas, 16 (15,5%) estavam em desacordo com a legislação em vigor5, sendo que em 3 (2,9%) delas foi observada a presença simultânea de parasitas considerados patogênicos para o homem. Dentre as 67 hortaliças, nas quais foi realizada a pesquisa de coliformes a 45°C, em 28 (41,8%) os níveis encontravam-se acima de 200 (NMP/g)6. Em apenas uma amostra, foi isolada Salmonella panama. Em 15 (14,6%) das 103 hortaliças foram detectados simultaneamente, parasitas considerados patogênicos para o homem (cistos de Entamoeba spp e de Giardia spp e ovos de ancilostomídeos, de Ascaris spp e de Trichuris spp). A presença de cistos de Entamoeba spp e de ovos de ancilostomídeos foi valorizada somente em concomitância a uma concentração igual ou superior a 200 (NMP/g) de coliformes a 45°C.

Tabela 1 apresenta o resultado das análises microbiológica e parasitológica em 18 (38,3%) das 47 hortas avaliadas em estudos anteriores. Na Tabela 2, estão os resultados encontrados nas 18 (43,9%) das 41 hortas sem avaliações prévias.

 

 

 

 

As doenças transmitidas por alimentos (DTAs) têm recebido atenção cada vez maior em todo o mundo4. Entretanto, no Brasil são escassos os trabalhos avaliando a qualidade das verduras coletadas diretamente das hortas10 12 e das respectivas águas de irrigação10, sendo que a maioria dos estudos refere-se às verduras obtidas nos pontos de venda7 9 13. Dentre as 67 hortas nas quais houve avaliação concomitante de coliformes a 45°C na água e nas hortaliças, 30 (44,8%) apresentaram níveis acima do limite tolerado. Das 21 hortas analisadas de acordo com a legislação em vigor1, 6 (28,5%) apresentaram na água de irrigação, níveis de coliformes a 45°C acima do limite tolerado. A presença simultânea de parasitas foi detectada em 15 (17%) das 88 hortas avaliadas. Chama a nossa atenção a presença de Giardia spp em uma amostra de água de irrigação, pois os cistos deste protozoário são altamente resistentes às condições adversas do meio ambiente, podendo contaminar a água e os alimentos11 14.

O presente estudo revelou que 40,9% do total das hortas analisadas estavam em desacordo com a legislação, tanto nas hortas previamente avaliadas (38,3%) como nas investigadas anteriormente (43,9%), configurando a não melhora das condições higiênico-sanitárias das hortas produtoras de verduras no município de Ribeirão Preto. A existência do sistema de fiscalização das hortas e a presumível conscientização dos produtores quanto às condições higiênicas não foram capazes de evitar a elevada freqüência de contaminação bacteriológica e parasitológica.

Tendo em vista os resultados obtidos neste estudo, ressaltamos a real importância da manutenção de um sistema rigoroso de vigilância sanitária das hortas produtoras de verduras do município, visando uma melhor condição higiênico-sanitária das hortaliças oferecidas à população. Apesar da não constatação de ovos de Taenia sp descrita por Marzochi8, e Oliveira & Germano9, a elevada freqüência de contaminação fecal indica o potencial risco de transmissão de ovos da Taenia soliumatravés do consumo de verduras cruas, podendo justificar a alta prevalência da cisticercose no nosso município.

 

REFERÊNCIAS

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4. Centers for Disease Control and Prevention. Diagnosis and management of foodborne illnesses: a primer for physicians. Morbidity and Mortality Weekly Report 53 (RR-4):1-33, 2004.        [ Links ]

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14. Thompson RC, Monis PT. Variation in Giardia: implications for taxonomy and epidemiology. Advances in Parasitology 58:69-137, 2004.        [ Links ]

 

 

 Endereço para correspondência:
Dr. Osvaldo M. Takayanagui
Dept° Neurologia/FMRP/USP
Av. Bandeirantes 3900
14048-900 Ribeirão Preto, SP
Tel: 55 16 3602-2472
e-mail: otakay@rnp.fmrp.usp.br

Recebido para publicação em 28/8/2005
Aceito em 23/3/2007
Apoio financeiro: Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) – OMT (Proc. # 305553/2006-2).